17 dezembro 2018

Caetano Veloso levado ao Tribunal na Bahia, João Jorge Amado e Setúbal.

Para inviabilizar uma ação de justa causa requerida por certo patrão contra uma sua funcionária, um sagaz advogado lança mão de seus conhecimentos extra-judiciais e produz um inaudito arrazoado que leva ao TRT o trabalho de Caetano Veloso, utilizando como irrefutável argumento um popular verso do cantante e compositante consagrado mundo afora. Este é um dos casos reais ocorridos no âmbito do TRT da Bahia. Onde mais, onde mais? Afinal, isto aqui ô, ô, é um pouquinho de Brasil, ai, ai. Este caso e dezenas de outros estão compilados no livro Pequeno Anedotário do TRT da 5ª Região, com textos deliciosos de João Jorge Amado e ilustrações de Setúbal que, obviamente, sou eu mesmo, sendo que de uns tempos para cá estou me assemelhando mais e mais a certas figuras que têm o questionável hábito de falar de si mesmo na terceira pessoa, sendo bom você, caro leitor, a exemplo de um estoico escoteiro, ficar sempre alerta pois isto pode pegar qual gripe ou conjuntivite. 
Como o caso em pauta é desses que a gente gosta e se enrosca, assim como o texto de João Jorge Amado, prazeroso e sucinto, reproduzo-o aqui na íntegra para você se deliciar, gourmet leitor:
"No fim dos anos 60, início dos anos 70, quando o comércio da Rua Chile permanecia aberto até o meio dia do sábado de carnaval, a balconista da Sloper, dizendo-se doente, obteve do INPS, na sexta-feira que antecedia aos três dias oficiais do Carnaval, um atestado médico concessivo de dois dias de licença. No sábado de carnaval foi flagrada pelo gerente, na porta da loja em que trabalhava e em horário de serviço, pulando atrás de um trio elétrico. O patrão pôs a moça no olho da rua, dando motivo a uma reclamação trabalhista em que ela obteve ganho de causa vencendo em toda a linha. O patrão recorreu, mas teve seu recurso improvido em acórdão cujos fundamentos podem ser sintetizados por esta frase do voto de Humberto Machado: "O fato da reclamante sambar em nada constitui ato ilegítimo, pois, como diz Caetano Veloso, atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu..."
Mestre Orlando Gomes, comenta o acontecido em artigo publicado no Jornal da Bahia, de 25 de outubro de 1972 e conclui que: "...duas revelações foram feitas e consagradas com tal segurança e firmeza que a partir desse importante julgado os estudiosos do Direito do Trabalho não podem mais alegar ignorância de que: 
1º) Entre o elenco dos direitos do empregado é de incluir-se, obrigatoriamente, o direito de sambar;
2ª) Entre as autoridades que formam a doutrina trabalhista, é de se inserir Caetano Veloso. 
O direito de sambar tem seus pressupostos de eficácia, tais como:
A) Há de ser exercido em clima carnavalesco;
B) Há de ser praticado na rabada de um trio elétrico."
Em matéria de humor e de fatos insólitos, na Bahia a realidade supera em muito a ficção.
**********A caetanística ilustração desta postagem foi esboçada sobre papel Opaline 180 g, arte-finalizada com caneta nanquim e retícula Letratone. Querendo vê-la mais detalhadamente basta clicar sobre ela, ampliando-a.