22 outubro 2017

Deus e o Diabo na tela do sol

 O cinema norte-americano sempre foi uma arma de aculturamento em nossas cabecinhas tupiniquins. Quando ainda um niño de Jesus eu ia ao cinema em Candeias e na telona, linda, panorâmica, vasta e apaixonante, a magia do cinema me pegou para todo o sempre. E vai daí eu, embevecido, via filmes de cowboys metendo incontáveis e imerecidas balas em indígenas que eles, é claro, mostravam como sendo seres sórdidos, cruéis, insidiosos e nada hospitaleiros com o bom e sempre bem intencionados homens brancos ianques, com suas famílias e suas inflexíveis intenções de se instalar em terras consideradas sem dono, já que os indígenas não tinham escrituras lavradas em cartório. A bem da verdade, os autóctones não tinham nem cartório e sequer sabiam nada sobre a funcionalidade deles. Um dia, nesse Brasil brasileiro, mulato inzoneiro, surgiu em cena um cineasta chamado Lima Barreto e eis que ele abocanhou a Palma de Ouro em Cannes mostrando um brasileiríssimo cangaceiro em suas andanças pelo inóspito sertão. Tempos depois veio Glauber Rocha e seu genial Antonio das Mortes que deixou siderados cinéfilos e grandes diretores do planeta, e de quebra nos mostrou Deus e o Diabo se arrostando na Terra do Sol. E eu ali, sempre firme, apaixonado pela temática cangaceiro-e-sertão-do-nordeste. Sempre que faço uma HQ ou um cartum aproveito o tema. E quando pinto, o resultado são coisas como esta pintura aí, um painel de quase 1 metro e meio de largura por 2 metros de altura. Paixão pela temática de sertões e cangaceiros é issaí!
(19/10/14)

Norman Rockwell / Uns caras que eu amo 3



No vasto mar da Internet todos nós, intrépidos internautas, podemos desfrutar do prazer de olhar belíssimas ilustrações que ali foram postadas justamente para que possamos conhecer os trabalhos feitos por habilidosos profissionais. Esses artistas, valendo-se das mais variadas técnicas, produziram desenhos, gravuras e pinturas magníficos. Hoje, graças a sofisticados programas de computadores, qualquer ilustrador tem à sua disposição uma grande gama de possibilidades de produzir belíssimas ilustrações. A informática, sempre providencial, lhe dá múltiplas ferramentas para tornar isso possível, o que nos leva a pensar. Em passado bem remoto, ou nem tanto assim, havia artistas que produziam uma arte deslumbrante e eles não precisaram de computadores para serem os estupendos artistas que foram. Um cara como o ilustrador norte-americano Norman Rockwell, por exemplo, usava os materiais que o século XX lhe permitia usar, ou seja, prosaicos lápis, carvões, nanquim, aquarelas e tintas a óleo, desses materiais que perduram até os dias atuais, acessíveis a qualquer vivente. Isso foi mais que suficiente para ele alcançar a fama incontestável de gênio a que merecidamente faz jus. O grande diferencial estava em seu raro talento em pensar e executar seu ofício, o que o tornou um cara cultuado até essa era digital de tantas possibilidades maravilhosas de hoje. Norman tinha a habilidade para retratar pessoas e cenários de uma forma admirável. Sendo o grande artista que era não se limitava a fazer reproduções perfeitas, coisa que muitos bons artistas o fazem, ele ia além, bem além. Sabia como ninguém transmitir em minúcias a alma das pessoas e o clima de seu país. Seus pincéis mostravam de forma sútil mas evidente o sonho americano, anseios, alegrias, diferenças, incertezas, emoções de pequenos instantes da vida comum dos seus contemporâneos, em uma dimensão sem precedentes. Norman, sem ser panfletário nem estereotipar, fazia uma deliciosa crônica do american way of life. A paixão, as descobertas da infância e da adolescência, a solidão, os temores, as maledicências, o amor materno e todos os demais amores, a ansiedade, a angústia, a solidariedade, o preconceito mais indizível, a comoção, as certezas, as crenças, as esperanças. Tudo isso e muito mais, traduzindo como ninguém jamais o fizera, os sentimentos do americano médio, do pobre, do rico e mesmo os da raça humana como um todo, mostrando um olhar atento ao seu tempo, à vida como um todo. Sem jamais esquecer apaixonantes pitadas de humor e a mais refinada ironia. Fazer belas ilustrações muitos fazem e para fazer belos trabalhos gráficos o computador em muito ajuda os profissionais. Mas criar tendo o olhar atento e aguçado, a sagacidade, o humor e talento de Norman Rockwell, bem...aí é outra história.      

14 outubro 2017

Ramona Fradon: uma mulher talentosa que provou que ser desenhista top de histórias em quadrinhos não é privilégio dos homens.

Quando falamos de histórias em quadrinhos e de seus grandes artistas em todos os tempos, a menção aos EUA é obrigatória, tão vastíssima é a produção norte-americana de tiras e HQs em todos os gêneros possíveis desde que essa forma de comunicação foi levada a leitores do mundo inteiro. Dentre esses leitores, os mais assíduos sabem citar de cor e salteado uma extensa lista com os desenhistas e argumentistas mais afamados e talentosos. No entanto, o talento nem sempre caminha pari passu com a fama e assim, há artistas maravilhosos, excelentes em seu ofícios que apesar de seus invejáveis talentos não têm o nome conhecido nem costumam ser citados pela grande legião dos fãs da Nona Arte. Quando se fala em profissionais, as histórias em quadrinhos são sempre associadas às figuras masculinas. Geralmente as pessoas ignoram que há ótimas profissionais escrevendo ou desenhando HQs. Uma dessas profissionais chama-se Ramona Fradon, uma desenhista espetacular com uma respeitável e diversificada produção de quadrinhos, notadamente na área de heróis ou superheróis como Aquaman, Batman, Robin, Mulher Maravilha, Superman, Supergirl, Superamigos, Lanterna Verde e uma interminável lista mais. Ramona é hoje uma bela senhora de bem vividos 90 anos de idade e iniciou a trabalhar como profissional em 1950, fazendo diversas funções, seja executando desenhos a lápis ou atuando como artefinalista, capista, criadora de personagens. Sempre requisitadíssima, produziu incontáveis trabalhos para a DC Comics e para a Marvel Comics, entre outros grupos notáveis. Ganhou prêmios importantes, sendo que em 1999 ingressou no Woman Cartoonists Hall of Fame, e em 2006 no Eisner Award Comic Book Hall of Fame. Por tudo isso, Ramona pode ser também considerada uma verdadeira Mulher Maravilha. 
Ilustro essa postagem com mais trabalhos de Ramona Fradon. Deliciem-se, amáveis e privilegiados leitores. De quebra, posto uma foto dessa wonder lady para vocês verem com seus próprios olhos que aos 90 anos ela se mantém uma gatinha. E o mais importante: em plena atividade profissional, segue nos brindando com seus desenhos magníficos.
(27/08/16)

J.Bosco, um caricaturista e seu livro de maravilhas

1. Lupicínio Rodrigues 2. Bertold Brecht 3. Martin Luther King
Fui agraciado esse ano com grandes e preciosos livros de assuntos, os mais diversificados: poesias, contos, crônicas, biografia, cartuns, caricaturas. E é justamente sobre um livro de caricaturas em especial que quero falar a vocês, diletos e amados leitores. Trata-se de uma edição primorosa, graficamente muito linda, contendo magnífica mostra da obra de J.Bosco, um artista do cartum, da charge, da caricatura e do grafismo, que veio ao longo dos muitos anos de profissão mostrando uma clara e incontestável evolução de seu trabalho - do traço à maneira de criar e definir seu desenho - até atingir o atual estágio em que se evidencia sua maturidade e os caminhos próprios que adotou para nos brindar a todos nós, seus leitores e fãs. O traço de J.Bosco tem, a meu ver, algo do consagrado caricaturista Loredano. Só há mérito nisso, influências são coisas naturais na trajetória de qualquer grande artista na busca pelo seu caminho pessoal e essa ascendência certamente ajudou Bosco a criar seu trabalho pessoal, maduro, personalíssimo, tão consagrado hoje em todo o Brasil. Seu traço é bonito, suas hachuras são limpas e precisas, sua interpretação lança um olhar novo sobre personalidades já tão amplamente retratadas por outros consagrados caricaturistas. No livro, outra coisa digna de elogios é a cuidadosa seleção das 80 personalidades retratadas. Nada de subcelebridades, só o que há de melhor na música, na literatura, no cinema.  Desfilam pelas páginas do livro nomes como Pedro Almodóvar, Pixinguinha, Penélope Cruz, Cantinflas, Mazzaropi, Tarantino, Jackson do Pandeiro, Glauber Rocha, Groucho Marx, Jean Reno, Sean Connery e outras maravilhas que brindaram a humanidade com seus talentos. Um deleite para os olhos dos admiradores da nobre arte da caricatura, uma fonte generosa de prazer para todos que admiram essa forma de expressão. Eu poderia aqui dizer que Bosco está no apogeu de sua criativa carreira de caricaturista, mas teria que completar dizendo que isso é só por enquanto, a notável evolução do trabalho de JB seguramente vai levá-lo a patamares mais altos e seu traço se tornará ainda mais bonito e preciso, não tenho a mínima dúvida. Para dar uma idéia da excelência do trabalho bosquiniano, ressalte-se que a cultuada revista Gráfica, capitaneada pelo venerado Miran, recentemente dedicou uma de suas disputadas edições ao trabalho desse artista paraense, mostrando que a caricatura brasileira torna-se muito mais rica e admirada com a arte de J. Bosco. 
(Publ. orig. 29/11/15)

13 outubro 2017

Caetano, Glauber, Jorge Amado em uma seleção de artistas e intelectuais do mundo inteiro

De cima para baixo e (sem nenhuma intenção de conotação política) da esquerda para a direita:
Sigmund é Freud/Salvador Dali da Catalunha/Jean Terrible Genet/Fernando Muitas Pessoas/Albert Little Tongue Einstein/Louis Cheeks-and-Arm-Strong/Villa-Índio-de-casaca-Lobos/Charlot Chaplin/Jorge Mui Amado/Caetanos Velosos/Glauber Deus-e-o-diabo Rocha/Marlon Nada Brando/Luciano Gogó Pavarotti/Woody Woodpecker Allen/Nelson Flu-e-Flag Rodrigues/Elvis The Pelvis/Andy Peacehol/Imagine Lennon
(28/03/2014)

03 outubro 2017

Biratan Porto e Max Reis com suas deliciosas crônicas.

De Belém do Pará, onde tenho amigos do peito, recebo um presente digno de rei que um desses amigos fraternos generosamente me envia. Trata-se de algo assaz envolvente, mas não se trata de um disco de carimbó do Pinduca, nem um tecnopop da vibrante, esfuziante e contagiante Gabi Amarantos. É coisa saborosíssima, mas esclareço logo que não é uma tigela recheada de um delicioso açaí. Trata-se de um belo exemplar de Ora, mas tá!. Se você não captou, explico que esse é o título de um livro de crônicas escritas por Biratan Porto e Max Reis. Magistralmente escritas, devo acrescentar, na minha modesta avaliação de apaixonado leitor do gênero, vez que crítico literário não o sou. O livro em si, é bonito, tem belas soluções gráficas para a capa e para os textos internos. Quanto aos autores, caro leitor, como sua mente sagaz e atilada já percebeu, Biratan Porto é aquele cultuado cartunista, autor de belos cartuns premiados mundo afora, por conta de seus desenhos e ideias magníficas, muitas delas abordando temas ecológicos, denunciando desmatamentos e a poluição que atinge criminosamente metrópoles, lagoas, mares e rios. E por falar em mares e rios, Biratan não é nenhum peixe fora d’água quando assume o papel de escriba. Na seara das crônicas ele transita com a mesma desenvoltura com que traça seus magistrais cartuns, exibindo sua proverbial criatividade, uma sensibilidade tocante, reveladora de uma autêntica alma de cronista, que mergulha na sua rica memória afetiva para nos brindar com jogos e folguedos de sua infância saudável, plena de alegrias, ludicidade e descobertas vividas com intensa felicidade por quem foi um típico menino do interior do Pará, para quem as ruas, becos, praças e campos de Castanhal compunham um reino a ser explorado e ele, um rei em seu corcel, intrépido, arrojado, destemido vivenciando toda sorte de possíveis aventuras, momentos épicos e plenos de magia, tão mágicos que um dia viraram letras, palavras, substantivos, adjetivos, verbos e pousaram no papel das páginas que compuseram um dulcíssimo livro de crônicas que li com intenso prazer. Além, muito além dessas reminiscências vai Biratan, passeando também pela ficção com o mesmo olhar observador, atento aos mais discretos detalhes ocultos nos lugares mais recônditos. Mas reservarei isso para abordar em um próximo texto. Neste me cabe contar também sobre seu companheiro de empreitada literária, Max Reis, que vem a ser o outro cronista de Ora, mas tá!. Que formidável dupla formam Biratan e Max Reis! Max, também se vale de sua memória para buscar na infância - igualmente vivida de forma intensa - e na sua juventude as lembranças de amigos fiéis, lugares, folguedos, namoros, as paixões adolescentes e as maduras. Tudo costurado com a mesma linha da emoção, própria de quem sente um perceptível prazer em viver, sempre olhando as coisas de um ângulo bastante pessoal em que se acumulam o humor, o amor, o filosofar, a indagação, a contestação, o apego ao modo de vida próprio dos viventes do Pará, de detalhes simples à primeira vista, mas com uma riqueza e exuberância que Max sabe captar, apreender e revelar aos leitores de suas crônicas. Não se resume ele a fazer um memorial. Das coisas vividas e vistas ao longo da de sua vida, Max Reis - mostrando intimidade com as palavras – recupera detalhes que agora revela em minúcias, coisas que por vezes escapa aos olhares dos mais desatentos, daqueles muitos que passam pelas coisas olhando sem ver. 
*****Com entusiasmo, aconselho aos que são chegados a uma boa leitura, especialmente de crônicas, que encomendem seu exemplar desse livro de leitura tão convidativa e prazerosa. Para fazer a encomenda do livro basta enviar uma mensagem para http://biratan.cartoon@gmail.com . E é bom você não marcar touca, senão a edição se esgota e aí vai ficar se lamentando. E quem olhar você, no maior desconsolo por ter dado tal bobeira, há de dizer: “Ora, mas tá!”