30 setembro 2014

O fim do Orkut e seu efeito na vida das pessoas / Reprodução de texto do jornalista Gonçalo Júnior

"O FIM DO ORKUT"
"O Orkut acaba nesta terça-feira. Decidiram que não serve mais para nada. Não dá lucro. Não dá dinheiro. Por isso, será desativado. Quem quiser fazer download dos arquivos o prazo vai até setembro de 2016. Mas ninguém poderá baixar todo o conteúdo do site, claro. Impossível. Só o quinhão que lhe cabe.
Nunca o explorei como todas as pessoas à minha volta o fizeram por vários anos. Tinha uma conta criada à minha revelia pelo Gmail que jamais alimentei. Tanto que tinha apenas 25 pessoas em conexão e só uma foto. Mas fico pensando que seu fim é, em primeiro lugar, um exemplo do quanto a revolução digital transforma e atropela a história em uma velocidade impressionante.
O Orkut, pelo menos no caso do Brasil, foi uma ferramenta que mudou a vida e as relações de milhões de pessoas. Ali estão registros de reencontros, declarações de amizade, de amor, de alegria, lamentos e tristezas, relações que renasceram ou romperam, ciúmes, ódio e discórdia, depoimentos de amigos, fotos e interações com outros usuários em comunidades.
Não posso ter nostalgia do que não vivi. Mas lamento que todo esse manancial de memórias seja apagado desse modo. Ou seja, a partir de 2016. Por uma questão de respeito, todo esse gigantesco acervo deveria ser preservado para futuras gerações, para a história, do jeito que está, mesmo como um lixão da internet, como aparentemente parece.
Mas não é. Longe disso. O Orkut é, nesse momento, uma monumental biblioteca da memória virtual de seus usuários, da intimidade das pessoas, da explosão de emoções e sentimentos que elas tiveram ao lidar com essa fantástica novidade. Ali estão histórias de pessoas vivas e muitas que já se foram. Desapareceram, algumas foram atraídas por assassinos e estupradores, até. O pouco desses seres tão preciosos para seus entes queridos estão ali.
Não sei se os donos do Orkut têm o direito de sepultar tudo isso. Penso na memória, na história de tantos anônimos. Penso no quanto a rede foi importante para aproximar muitos do computador e da Internet. Penso na história do nosso tempo, extirpada de modo tão violento. Penso como contaremos a nossos netos e bisnetos como existiu em um passado importante a primeira grande rede social da história."

12 setembro 2014

Cedraz, maravilhoso desenhista de HQs, descrito por Suely Furukawa

Sobre o falecimento de Antonio Cedraz, desenhista de quadrinhos com uma carreira brilhante e premiada, amigo leal, constante, homem generoso para com todos, desprendido, que tratava de maneira calorosa e afável quem dele se aproximasse, principalmente desenhistas novatos a procura de conselhos, que devido seu talento, dedicação constante e imensurável amor à Nona Arte se tornou admirado, Suely Kurosawa, profissional da área e fiel amiga de todas as horas escreveu:
"Para quem nao sabe, ANTONIO LUIZ RAMOS CEDRAZ, simplesmente Cedraz, era autor da Turma do Xaxado."
Nós fomos apresentados a Antonio Cedraz por Carlos Avalone, desenhista na antiga Divisao de Publicações Infanto-Juvenis da Editora Abril.Em uma época em que não imaginávamos a Internet, e-mails e muito menos as redes sociais, Avalone trocava figurinhas sobre o mundo das Histórias em Quadrinhos, através de cartas enviadas a Cedraz. Tempo em que DDD era inacessível de tão caro, eles eram amigos por correspondência.
Quando soube que Paulo Paiva e eu iríamos passar nossa lua-de-mel na Bahia, passando por Salvador, Avalone nos deu telefone do Cedraz. Diretor de Arte do Banco Econômico, Cedraz era das raras pessoas que possuía telefone privativo em Salvador.
Hospedados em um antigo hotel decadente da periferia soteropolitana, ligamos para Cedraz. Em poucas horas, ele estava lá, com seu fusquinha cor de laranja, exigindo que fechássemos a conta pra irmos diretamente pra casa dele. Nunca tinha ouvido falar da gente. Éramos os amigos de Avalone, seu correspondente.Era final de julho de 1979, o começo de uma incrível amizade que completou agora 35 anos.
Através de Cedraz, conhecemos toda comunidade de desenhistas de Salvador, como Nildão, Caó e Lage. Com a ajuda dele, PP retomou contato com Setúbal, artista paulistano há muito tempo radicado em Salvador.
Amigo para horas boas e ruins... Foi em momentos de nossa maior dificuldade, quando PP, após sofrer um grave AVC, ficou 35 dias em coma e 5 meses no hospital, que Cedraz se mostrou amigo para todas as horas.
Me ligava regularmente naqueles dias de esperança alguma. Quando chegava exausta do hospital, me enchia de coragem, contando que rezava diariamente por nós.
Pouco depois da alta do PP, veio de Salvador nos visitar. Uns dois anos depois, ele começava a sua luta contra o câncer. Incontáveis cirurgias, baterias de quimioterapia e toda sorte de tratamentos. A cada hospitalização, nos telefonava após a alta, comunicando que vencera mais uma batalha.
Cedraz ainda tinha muitos planos... Mesmo sabendo que um dia o guerreiro seria vencido pelo câncer, a notícia de seu falecimento, na manhã de hoje, nos pegou de surpresa.
Taí um homem que viveu intensamente, realizou uma obra incrível, tanto na vida pessoal como profissional.
Autênticos personagens brasileiros, especialmente nordestinos, com riquíssima pesquisa, retratando nosso folclore como ninguém. Nós, amigos, temos a obrigação de dar continuidade à Turma do Xaxado, divulgando e perpetuando a obra de Antonio Cedraz."