Boa parte do tempo sou um agnóstico convicto ou um inveterado livre-pensador. Em outras sou um católico apostólico baiano, o que significa ter um pé em Roma - com sua infindável galeria de santos - e outro na África, com seus prestimosos orixás. Aqui nessa afroterra que habito, múltipla em todos os sentidos, o ecumenismo é um caminho natural que os que se pretendem justos devem civilizadamente trilhar em nome da paz e da mais fraternal das convivências. Há que se respeitar as escolhas pessoais no tocante à fé e tratar todas elas com igual carinho e humano respeito, e não seguir a senda maldita e o horror dos ortodoxos e fundamentalistas de todos os matizes que tentam se assenhorar do poder governista através da religião, visando estabelecer nefasta e sufocante teocracia. Preces fervorosas para o Homem de Nazaré, para Nossas Senhoras, para Siddartha Gautama, Allah, Jeovah,Tupã, orações para Allan Kardec e oferendas cheias de fé para Oxuns, Yansãs e Yemanjás. Fiz essa caricatura do maior ícone do catolicismo soteropolitano, Irmã Dulce, que tratava com desmesurada bondade pessoas pobres, doentes, desamparadas, sem ter mais a quem recorrer, seres humanos já desesperançados que a procuravam em busca de ajuda e a quem ela acolhia sem se importar se eram católicos, evangélicos, de religião afro, judeus, agnósticos, ateus, se eram héteros ou homossexuais, negros ou brancos, nordestinos ou não. Eram seres humanos carentes de amparo e isto era o que mais importava para que ela os acolhesse com suas próprias mãos, praticando o verdadeiro amor que Cristo sempre pregou e que muitos arrogantes que se dizem líderes religiosos jamais aprenderam e praticaram, utilizando o cristianismo e o nome divino para espalhar dominar multidões de carentes ou incautos, manipulando mentes com o grande poder de oratória que têm,
enganando os crédulos, deles tirando dinheiros, acumulando fortunas pessoais e levando despudoradamente uma vida de luxo e ostentação, morando em suntuosas mansões, aqui ou no exterior, com direito a anéis e banheiras de ouro, jatinhos particulares, automóveis dignos de xeiques, roupas dignas de reis, incontáveis latifúndios, lucrativas empresas pessoais e tudo que o dinheiro pode comprar. Diferentes, bem diferentes de Jesus Cristo que nada tinha de fausto e de pompa. Jesus, em sua simplicidade, trajava apenas uma túnica inconsútil para levar o que realmente importava: o amor, o respeito ao próximo e a palavra de Deus. Assim como Irmã Dulce, que usava tão somente um hábito surrado para amparar os desvalidos. Dulce, dulcíssima. Em sua forma física Irmã Dulce se foi, mas seu exemplo de verdadeiro amor ao próximo ficou, segue entre nós. E hoje certamente ela está lá no céu ajudando muitíssimo seu chefe, que ela não é mulher de ficar acomodada num canto. Odô yá, Irmã!
(11/11/13)