17 janeiro 2023

Montaigne, Chico Buarque e o Amor que não pede explicações.

O que faz nascer uma amizade imorredoura? O que move uma paixão desmedidamente extraordinária dentro de nossos humanos corações? O que nos leva a gostarmos tão intensamente de uma pessoa, por vezes tão diversa de nós? Ou a nos apaixonarmos perdidamente por alguém e mantermos com esse alguém um relacionamento que, no dizer do Poetinha, enquanto dura, infinito é. Amigos, parentes, conhecidos e desconhecidos, veem essa relação vivida com olhos de quem assiste a algo em que a lógica se volatiliza e se lhes escapa, algo improvável, indefinível, pleno de estranheza, difícil de ser decodificado, entendido, assimilado. Para desvendar esse mistério, buscando um satisfatório entendimento disso, Chico Buarque - compositor, cantor, dramaturgo e escritor - foi buscar a melhor definição nos ensaios de Michel de Montaigne, o célebre escritor, humanista e filósofo da França, sempre a França. Chico conta em um vídeo que Montaigne era insistentemente questionado sobre o porquê de sua mais que imensa e eterna amizade por outro humanista e filósofo francês, Étienne de La Boétie, cuja morte precoce levou Montaigne a escrever o ensaio “Da amizade”, em que dizia apenas que gostava dele e ponto. Quinze anos mais tarde, revendo o que escrevera, o escritor acrescentou que gostava muito do amigo La Boétie por uma razão: “porque era ele”. Foram precisos que se passassem outros quinze anos para o filósofo fazer um novo acréscimo à frase, completando-a definitivamente: “porque era ele, porque era eu”. Chico entendeu como simples, porém perfeita, a definição dada por Montaigne. Achando que perfeita ela também era para definir a paixão, o amor que sentimos por outro alguém, dela se valeu para compor uma música feita para a trilha sonora do filme brasileiro A máquina, do diretor João Falcão. A essência do que definiu Montaigne está no nome da música: “Porque era ela, porque era eu”. Maravilhoso, formidável Montaigne. Maravilhoso, formidável Chico Buarque.
(040916)