31 janeiro 2021

Uma Confraria de Tolos no Brasil de tantos espertos

Um dos mais deliciosos e bem escritos romances que já li chama-se Uma Confraria de Tolos (A Confederacy of Dunces), de autoria do  escritor norte-americano John Kennedy Toole. Não é de surpreender se você, pessoa sobejamente culta que cultiva o salutar hábito da boa leitura, disser que nunca dantes ouvira falar ou lera algo a respeito desse livro ou de seu brilhante autor. Mesmo entre os devoradores contumazes de livros,  gente que lê tudo que lhe cai nas mãos, são poucos a conhecê-los.  Alguns detalhes talvez justifiquem a pouca informação existente como o fato do livro não haver sido lançado por nenhuma das  grandes editoras norte-americanas nem  ter sido amparado por suas mídias poderosas que tornam qualquer livro conhecido em todo o planeta, alavancando grandes vendas, mesmo que o referido livro não tenha de fato qualidades intrínsecas que o referendem como uma obra comprovadamente digna de figurar no rol das grandes criações literárias. Uma Confraria de Tolos foi publicada pela Louisiana University, onde Toole lecionara, numa afetuosa homenagem póstuma acontecida graças ao empenho de sua dedicada mãe e ao respeito e sentimento de solidariedade dos dirigentes da aludida Universidade.  Vale frisar que tal publicação só ocorreu em 1980, onze anos após sua lamentável morte em 1969. Com apenas 31 anos de idade, JKT deixou este mundo muito cedo, sem ver satisfeito em vida seu enorme desejo de ser reconhecido como o brilhante escritor que sempre foi. O Pullitzer que lhe foi outorgado postumamente atesta a elevada qualidade de sua literatura. Acredito que esses descaminhos e a falta de um reconhecimento mais amplo com o tempo haverão de ser superados pela qualidade do livro e John Kennedy Toole ainda virá a ser tido na conta de um escritor maior, senhor do seu ofício. Disto ele dá provas passeando seu talento por cada frase construída neste seu romance em que, imaginativo, surpreende o leitor a cada página, criando tipos insólitos - como seu personagem central, Ignatius Reilly – envolvendo-os todos em situações inusitadas, quase surrealistas, mas  sendo ao mesmo tempo tudo  muito real e tangível. Com segurança, JKT vai criando uma atmosfera para qual o leitor se vê transportado enquanto o autor transmite um recado que revela uma aguda visão crítica da sociedade que o circunda,  numa trama rica e envolvente alinhavada por  um humor raro, maravilhoso, que muito me encantou. Humor de alta qualidade que em passagem alguma soa gratuito, mostrando-se antes ser um humor consciente, refinado, bem dosado, questionador e - por mais paradoxal que possa soar - deliciosamente histriônico e o leitor atilado há de rir a alto e a bom som. Como admirador, faço votos para que um dia os críticos literários do nosso país deixem de lado por um momento certos best-sellers que rápido se volatilizam, esqueçam um pouco os livros de sucesso efêmero que soem figurar nas listas dos mais vendidos e possam descobrir a delícia que é Uma Confraria de Tolos e seu autor, John Kennedy Toole, como um dia o fez a Editora Record que não hesitou em publicar no ano de 1981 este livro que, em minha assaz modesta opinião de leitor, merece cadeira cativa na posteridade.
(201114)