22 outubro 2025

Um texto lúcido que elucida como e porque o Brasil abriu as portas para o extremismo de direita de tantos e tão inconcebíveis demonios que assolam nossos dias.

                                   ilustração: JOTA CAMELO

"O pior acontecimento da política brasileira nos últimos trinta anos foi a Operação Lava Jato. Travestida de cruzada moral, ela foi um projeto político deliberado, arquitetado para desorganizar o sistema democrático e reconfigurar o país sob o domínio da antipolítica. Sob o discurso da ética, construiu-se um populismo judicial que destruiu reputações, manipulou processos e sequestrou o Estado. O combate à corrupção virou espetáculo midiático de extermínio político — e, no fim, o que ruía não era um partido, mas a própria ideia de República.

Economicamente, o estrago foi devastad8or. As maiores empresas nacionais foram arrasadas, o parque industrial desmontado, milhões de empregos perdidos. Em nome da “limpeza”, liquidou-se o que o Brasil tinha de mais estratégico: a engenharia pesada, a Petrobras, o sonho de autonomia energética. A operação que dizia purificar o país o entregou de bandeja ao capital estrangeiro.

Politicamente, a Lava Jato foi o laboratório da extrema direita. Alimentou o antipetismo como religião e a antipolítica como moral pública. Substituiu o debate por linchamento, o voto por sentença, a política por ressentimento. O ódio virou método, e o juiz de Curitiba — com o beneplácito da mídia — transformou-se no herói de uma classe média que confundiu destruição com justiça e parece nao ter entendido nada do que isto representou.

O resultado foi a corrosão das instituições e o desmonte do pacto civilizatório. A Justiça tornou-se instrumento de guerra; o Ministério Público, partido político; a imprensa, arma ideológica. O moralismo converteu-se em anestesia para o avanço neoliberal e a repressão social. O Brasil, hipnotizado pelo discurso da pureza, cavou a própria ruína.

E, como se não bastasse, o país ainda premiou o algoz. Um dos maiores vacilos da história jurídica e política brasileira foi o alívio concedido a Sérgio Moro — o homem que sabotou a democracia, interferiu em eleições e destruiu a confiança na Justiça. Ele jamais poderia ter sido candidato, jamais poderia ocupar cargo público. Sérgio Moro deveria estar fora da vida pública e preso. Porque é, objetivamente, um criminoso.

Há um lavajatismo redivivo no sistema jurídico brasileiro, espalhado como mofo nas paredes do poder. A operação foi formalmente enterrada, mas sua teologia moral segue viva. Na mais alta corte, Luiz Fux reocupa o púlpito da cruzada judicial, enquanto no Ministério Público Federal o espírito de Curitiba renasce com novos apóstolos. O procurador-geral Paulo Gonet abriga em torno de si o mesmo núcleo ideológico que deu sustentação à farsa original — e ali, à sombra do cargo, atua Januário Paludo, o mentor intelectual de Moro, o “guru” que moldou o lavajatismo como se fosse doutrina de fé.

Esse vírus institucional também contaminou a Polícia Federal, onde segmentos inteiros ainda operam segundo o manual do espetáculo e da perseguição seletiva. É o velho moralismo punitivista, agora travestido de técnica, infiltrado em inquéritos e vazamentos calculados. O Estado brasileiro continua refém de corporações que confundem poder com virtude e impunidade com justiça. E enquanto essa casta se protege, o país permanece ferido. Sérgio Moro é o símbolo máximo dessa degradação — e o fato de ele estar livre, eleito e com foro é uma afronta à decência. Ele deveria estar fora da vida pública e preso. Porque é, sem disfarces, um criminoso."

Texto de Ricardo Queiroz