11 março 2017

O cartunista Valtério e suas fantásticas criaturas


Afirmam as crenças católicas que tão logo criou o mundo, Deus resolveu criar o homem para nele habitar. E assim o fez, esculpindo-o em uma porção de barro. Fácil é deduzir que além de fazer surgir o primeiro ser da espécie, o Onipotente criou também a ainda inédita atividade de esculpir. Ou seja, avant la lettre, Deus foi um escultor, o que o torna assim um ilustríssimo colega de meu nobre amigo Valtério Salles que também esculpe em barro criativas figuras humanas e todo um mundo de coisas belas. Uma vez em uma revista de circulação nacional li uma entrevista com Millôr Fernandes. O guru do Meyer se deixou fotografar em sua própria residência e fez questão de posar em sua sala de estar ao lado de uma caricatura sua esculpida em barro. Detalhe: a peça tão apreciada pelo gênio da raça era um trabalho de Valtério. Essa incontestável habilidade de Valtério de esculpir em barro não preencheu de todo seu vasto impulso criativo.  Vai daí que ele retomou o desenho, ponto de partida de sua caminhada artística surgido ainda na sua infância vivida em Ruy Barbosa, no interior da Bahia.  Nos anos setentas, morando no Rio de Janeiro, tomou aulas no Senac com o cartunista Guidacci, afamado por exercer bem o ofício. Aos pouquinhos foi se aperfeiçoando, publicou em revistas e jornais, entre eles no emblemático O Pasquim. Sabendo que só a prática habitual e a perseverança poderiam melhorar seu desenho, há já um bom número de anos Valtério muniu-se de bloco de desenho e lápis e saiu desenhando um mundaréu de gentes pelas praias e barzinhos da Bahia. Pessoas ditas comuns e desconhecidas, o que não expressa bem a veracidade dos fatos. Na verdade, cada uma delas é mais notável que a outra em sua forma de ser, sendo também todas muito conhecidas por todos nos ambientes que frequentam. Assim sendo, Valtério caricaturou ao vivo banhistas, habitués de barracas, ávidos bebedores de cervejas e destilados, comensais de caranguejos e lambretas, vendedores de coco, picolé, queijo coalho, meninos, jovens, adultos, provectos senhores, homens e mulheres. O resultado disso foi que seu traço foi ganhando maturidade, ficando solto e se tornando cada vez mais bonito e seguro, diferenciando-se das suas influências e tornando-se mais próprio a cada trabalho feito. Então, deu-se que Valtério achou que era chegado o momento de publicar em livro o resultado de seus périplos praianos e o fez em um livro batizado de Criaturas. Nele, o autor junta seus modelos populares e mostra ainda um lote de seus amigos afamados, constando entre eles, escritor, jornalista, poeta, músico, artista gráfico, cineasta. Todos desenhados com o mesmo carinho, eternizados pelo belo e solto traço que Valtério conquistou nessas suas andanças pelos recantos baianos enriquecendo ainda mais seu cabedal artístico. De quebra ele republica hilários cartuns e caricaturas já antes publicados em jornais e revistas da imprensa brasileira. Como alguém que gosta muito de desenhos, foi com grande prazer que folheei cada uma das páginas de Criaturas, deliciando-me com os desenhos valterianos que certamente farão também a delícia de todos os leitores que amam a boa arte.
***Para adquirir seu exemplar, contatos pelo e-mail valterio.sales@terra.com.br     
(Publicado originalmente em 01/08/2015)