29 maio 2018

Ziraldo, o preconceito de colete no programa da Leda Nagle.

Um dia, já faz algum tempo, assisti no "Sem Censura", da TVE, uma entrevista feita pela mineira Leda Nagle com o mineiríssimo Ziraldo. Todos os blocos do programa foram a ele dedicados. Nada mais justo. Ziraldo tem uma trajetória brilhante e irretocável no universo das Artes. Sua importância na vida de todos os cartunistas e grafistas brasileiros é imensurável. Criativo, atuante, dinâmico, dono de um traço e de um humor de primeira linha que encanta qualquer um, em qualquer parte do planeta, o grafismo brasileiro deve muito a ele, tanto nacional quanto internacionalmente. Todos os adjetivos usados para elogiar seu trabalho e sua trajetória vitoriosa serão sempre poucos. Voltando ao programa,  a certo momento, não sei a título de que, Ziraldo declarou a Leda: " O baiano é um falso!" E não falava de alguém em particular, referia-se à coletividade, e o disse com todas as letras - ipsis litteris e ipsis verbis - como se falasse a mais irrefutável das verdades. Deitou falação afirmando que o baiano fatalmente trai os amigos na primeira oportunidade que tiver, devendo as gentes contarem como inevitáveis as insídias perpetradas pelos natos neste afrobaiano torrão. Leda, mineirinha que só ela, mesmo tendo muitos amigos baianos não questionou o entrevistado sobre a despropositada assertiva. Talvez porque o nome do programa a impedisse de fazê-lo. Preconceitos de tal ordem são chocantes e inconcebíveis tanto mais por terem saído da boca de um formador de opinião com enorme influência sobre milhões de crianças que amam o que dele vem, sobretudo através de uma TV pública em que se deve buscar levar à população o melhor que temos em nossa cultura. Injustificável que pensamentos tão mesquinhos, injustos e tão absurdamente falaciosos povoem uma mente criadora revelando vivos resquícios de preconceitos que mais cheiram a chifre queimado. Ao invés de seguir a dialética de outro célebre mineiro, Pelé, famoso por pronunciar frases que não deveriam terem sido ditas, Ziraldo poderia se espelhar no seu nobre conterrâneo Afonso Arinos que passou à História ao ter seu nome numa lei que arrosta e pune os preconceituosos. Ou ainda em um outro mineirinho, o queridíssimo Drummond, mui amado por nós, baianos, por ser lhano, cordato e por bem saber lidar com as palavras não permitindo jamais que elas saíssem por aí impunemente cometendo injustiças nem desabonando o caráter afável do povo mineiro e das amadas Geraes.
(19/02/10)