Sem providenciais mecenas para ampará-los nesse mundo hodierno, os artistas plásticos que não alcançam as boas galerias - bem raras nesta urbe - sempre tiveram que partir para um renhido embate pela sobrevivência indo buscar possíveis compradores aonde eles estivessem. E nestes anos 70 lá estou eu com meu amigo Lima, que assinava seus trabalhos artísticos como H.Lima e era também conhecido popularmente como Lima Limão ou ainda como Macarrão 38, devido ao fato de em sua quase anoréxica magreza lembrar o famoso produto alimentício, uma massa das mais fininhas. Lima, gravador e pintor, marcha estoicamente, subindo e descendo inacabáveis escadas de prédios da Cidade Baixa tentando vender dois entalhes que recém fizera. Eu, seu fiel e prestativo acólito nesta empreitada dificultosa ajudo a carregar as peças. Lima, como já narrei em postagem anterior, conseguia dois pedaços de compensados, entalhava-os, coloria-os e saía em campo para o corpo-a-corpo necessário à subsistência. Com o dinheiro auferido, comprava novo material para preparar mais dois e repetir a façanha sem assim jamais conseguir acumular em sua casa e ateliê uma produção de seu trabalho, mínima que fosse. Nada disso tirava o constante bom humor baiano de Lima. Certo dia visitamos o escritório de um profissional liberal que em mais de uma oportunidade já comprara obras de meu amigo. Após olhar sem entusiasmo os trabalhos, o sujeito diz : "Você bem sabe que gosto de sua arte. Mas estes trabalhos seus não me agradaram. Façamos o seguinte: no próximo final de semana passo em seu ateliê e com calma olho todos os outros trabalhos que você tiver lá, escolho um que eu gostar e compro. Certo?" Ao ver o semblante de desalento de Lima, o homem inquire, desconfiado: "Você tem outros trabalhos em casa, não tem?" E Lima, a imagem da humildade personificada: "Quem sou eu, doutor, para ter um quadro meu?! Isto é pro senhor que pode!"
(Publicado originalmente em 06 de novembro de 2010)
(Publicado originalmente em 06 de novembro de 2010)