27 outubro 2016

João Ubaldo Ribeiro no tempo em que era um jornalista, com carteira assinada e tudo.

Antes, bem antes de atingir os píncaros da glória literária e de ser recebido com encarnados tapetes em universidades e palácios primeiromundistas qual um semideus, sendo reverenciado efusivamente em toda parte aonde quer que vá, Oropa, França e adjacências, o cultuado escritor João Ubaldo Ribeiro foi um dia - com direito a somítico salário - redator-chefe do hoje quase extinto periódico Tribuna da Bahia onde eu e Lage atacávamos de rabiscadores. Este jornal, em seus tempos de glória, tinha em seus quadros jornalistas gabaritados, os mais bem humorados com quem eu já trabalhei. Ainda assim nenhum superava o bom humor de Ubaldo que tinha uma risada peculiar, franca, aberta e sonora - uma sonoridade de miríades de decibéis - que ecoava em toda a redação quando ele, atendendo o aviso de algum colega: "Rápido! Está passando o Alberto Roberto na TV!", deixava incontinenti sua pequena sala cercada de vidro batizada de aquário, e vinha lentamente atravessando os mais de 20 metros da sala com seu tonitroante riso, prelibando os momentos de humor que a verve de Chico Anísio lhe traria. Tal proceder valeu-lhe, entre os espirituosos jornalistas, o epíteto de Risadinha. Conhecíamos-lhe e admirávamos o talento invulgar para a escrita - ele já fazia sucesso com o livro Sargento Getúlio - mas ninguém daquela risonha redação poderia prever que nosso bem humorado redator-chefe, unindo seu humor ao raro dom literário, um dia seria capaz de realizar no campo literário façanha tamanha como a que de fato realizou tornando-se um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos. De mero vivente, sujeito a frieiras, coqueluches, tosses-de-cachorro, defluxos, pruridos escrotais e afins, Risadinha sagrou-se um escritor de renome, consagrado em todo esse vasto mundo, com direito a vestir o garboso fardão da ABL, munido de espadim e tudo, convertendo-se, destarte, em um venerável imortal admirado e respeitado em todo este imenso orbe. Viva o povo brasileiro! E, é claro, viva também João Ubaldo Ribeiro, já que Risadinha, qual a Tribuna da Bahia, ficou por aí, em algum lugar do passado.
(10/10/12)