28 junho 2018

Frank Menezes: bofetada com luva de pelica


Quando exponho no Soho, NY, recebo um soberbo tratamento VIP, sendo reverenciado qual autêntico semideus pelo fervilhante e glamuroso universo artístico da Big Apple. Os mais consagrados popstars acorrem para oscular-me as santificadas mãos que pintam e caricaturam como guiadas por anjos - segundo words, words, words publicadas pelo New York Times. Até celebridades como o velho Al Hirschfeld - já falecido - comparecem para me prestigiar. E um providencial tapete vermelho sói antecipar meus passos. Mas - proh pudor!, proh pudor! - quando retorno a esta afro-baiana terra movido por indestrutíveis grilhões sentimentalísticos sou tratado como um reles mortal sujeito a pegar buzus apinhados de viventes com os mais hediondos odores e encarar uma sinuosa e interminável fila no Bradesco da Pituba. Em nela estando, anônimo qual apenas mais um do vulgo, perpasso meus gázeos olhos pelos desconhecidos companheiros de enfileirado infortúnio. Eis que avisto Frank Menezes, o maravilhoso ator, a quem vi a primeira vez atuando em A Bofetada, dirigida pelo meu chegado, Fernando, o Guerreiro, e depois em mini-séries globais, no filme Tieta e em peças outras. Fiquei fã incondicional. Frank, um tremendo artista que ali na fila nada mais era que um cidadão comum pagando suas contas. Luto contra um inesperado impulso tietagenístico que me empurra em sua direção. Ao vê-lo conversando descontraído, solícito e simpático com pessoas na fila crio coragem, aproximo-me, coloco no rosto meu melhor sorriso e declaro: "Sou um seu grande admirador e acompanho todos os seus trabalhos, Jefferson." Valei-me, meu São Freud! Minha mente levemente sequelada por algumas cannabis sativas fumadas no fulgor de minha juventude em anos de flower and power me prega peças até hoje e não me custa nada trocar um nome de provável origem anglo-saxônica por outro e lá vou eu pagando símio por aí. Meu alarme antigafe dispara e tento corrigir a mancada rápido qual um Usain Bolt: "Opa, Jefferson, não... Franklin. Mil perdões, Franklin!" Ele, fleumático e condescendente me diz: "Legal...mas não sou Jefferson nem Franklin. Meu nome é Frank." Isto tudo sorrindo, sem demonstrar indignação ou rancor. Mais uma para meu vasto cabedal de gafes. Vexado, volto lesto e presto ao meu lugar na fila onde permaneço hirto e silente. E resolvo que está mais do que hora de euzinho passar uma nova temporada na Grande Maçã entre meus very crazy fãs norte-americanos até que a vergonha se esvaneça. E tomo uma decisão: continuarei assistindo as peças deste grande ator que tanto admiro. Mas só irei aos teatros de óculos escuros, envergando chapéu de aba larga e uma capa com a gola levantada qual um Humprhey Bogart . E sem nenhuma Ingrid Bergman ao lado para não testemunhar minhas paquidérmicas gafes e dizer "Say it again, Set." 
(101012)